Introdução:
Sim, eles podem ser mocinhos ou vilões! Podem trazer a beleza e o caos! Podem fazer você vibrar de contentamento ou chorar de desespero! É deles mesmo que estamos falando: dos ácidos!
Bem-vindos a este universo cheio de peculiaridades, reentrâncias e segredos.
É com prazer que os convido a percorrerem comigo a trajetória destas moléculas tão importantes no cenário da cosmetologia. Venha desvendar as muitas nuances destes incríveis elementos.
Definição:
“Ácido” se origina da palavra latina “acidus”, que significa azedo. A princípio, o termo era aplicado somente ao vinagre, mas com o evoluir dos estudos percebeu-se que outras substâncias também possuíam características que atendiam a esta definição e foi a partir daí que a palavra ácido passou a fazer referência a uma categoria, comportando diversas substâncias.
Há várias definições para ácido. A mais utilizada é a dos químicos Brönsted e Lowry, que elaboraram a teoria protônica, segundo a qual ácido seria toda substância íon ou molécula capaz de doar prótons, partícula subatômica de carga positiva.
Noções Gerais:
Os ácidos, no senso comum, nos lembram produtos corrosivos e perigosos, o oposto dos produtos naturais. No entanto, isto nem sempre é verdade, pois existe uma infinidade deles na natureza e até mesmo o corpo humano os sintetiza para se manter vivo e com bom funcionamento. Há ácidos:
- No estômago (ácido clorídrico).
- Na urina (ácido úrico).
- Nos alimentos: laranja (ácido ascórbico), vinagre (ácido acético), gordura (ácidos graxos), leite (ácido láctico), arroz (ácido fítico e kójico).
- Nos medicamentos: analgésicos (ácido acetilsalicílico), sedativos (ácido barbitúrico), diuréticos (ácido etacrínico).
Logo, se você pensava nos ácidos somente como substâncias químicas, saiba que eles também podem ser naturais e que são extremamente vitais para o corpo e para o desenvolvimento de uma série de situações.
Os Ácidos na Cosmetologia:
Acredito que a coisa mais importante a respeito dos ácidos dentro da cosmetologia é não confundir ácidos orgânicos com inorgânicos.
Certa vez, ouvi uma pessoa perguntar como era possível aplicar ácidos na pele sem que eles corroessem a mesma e formassem um “buraco”.
Não tenho dúvidas que esta pessoa pensava nos ácidos inorgânicos que são aqueles que em sua maioria são corrosivos, tóxicos e degenerativos.
O exemplo mais clássico de ácido inorgânico é o ácido sulfúrico (H2SO4), considerado um dos mais fortes e perigosos.
Para você ter uma idéia do poder corrosivo deste ácido, ao colocar um pouco dele no telhado de sua casa, dias depois ele terá passado pela telha, pelo forro ou laje e cairá no chão. Estarrecedor, não é?
Outros exemplos de ácidos inorgânicos são:
- ácido fluorídrico (HF): corrosivo do vidro, por isso, muito utilizado em gravação de vidros.
- ácido nítrico (HNO3): usado na fabricação de explosivos.
- ácido clorídrico (HCl): usado na limpeza de pisos e superfícies metálicas.
Obviamente que estes “indivíduos” não são empregados nos tratamentos cutâneos.
Os ácidos aplicados para fins dermato-cosmetológicos são os orgânicos ou, para sermos mais especificos, os AHA’s (alfa hidroxiácidos) e os BHA’s (beta hidroxiácidos), que são ácidos não tóxicos, geralmente fracos e obtidos de fontes naturais.
Embora seu uso tenha se sedimentado na cosmetologia somente nos últimos 20 anos, não é de hoje que os ácidos são empregados nos tratamentos de pele.
A polêmica rainha Cleópatra, exaltada por sua beleza, já aplicava na pele leite azedo (ácido láctico), para mantê-la com aspecto jovial.
Na idade média, as damas da nobreza costumavam aplicar na pele “vinho velho” (ácido tartárico) para obterem branqueamento e suavidade.
Em 1959, o Dr. Stütgen, da Alemanha, introduziu o uso do ácido retinóico para o tratamento de algumas doenças cutâneas como a psoríase.
Em 1974, os AHA’s foram introduzidos na dermatologia para o tratamento de ictiose (doença de origem genética que apresenta como principal característica o ressecamento e a descamação da pele) e, subseqüentemente, para os tratamentos de xeroses e verrugas.
Somente em meados de 1985 começou-se a utilizar AHA’s e BHA’s em larga escala para os tratamentos de acne, queratose seborreica, despigmentação e foto-envelhecimento.
Hoje, na era da tecnologia cosmecêutica, os ácidos são considerados ferramentas importantes e indispensáveis na elaboração dos mais diversos tipos de tratamento tópico.
Principais Ácidos Cosmecêuticos:
Conheça os principais ácidos empregados em dermato-cosmiatria e suas respectivas fontes de obtenção:
- Glicólico: Obtido da cana-de-açúcar, beterraba e alcachofra.
- Mandélico: amêndoas amargas.
- Láctico: leite azedo (fermentação bacteriana).
- Málico: maçã-verde.
- Tartárico: vinho azedo (fermentação bacteriana).
- Salicílico: casca do salgueiro ou sintetizado em laboratório.
- Fítico: algodão, aveia, arroz, trigo, milho.
- Kójico: arroz (fermentação fungica).
- Ascórbico: laranja.
- Cítrico: laranja, limão, kiwi, acerola.
- Pirúvico: sintetizado em laboratório.
- Retinóico: acidificação da vitamina A.
Noções Químicas:
Embora existam outras categorias de ácidos que estão ganhando representatividade na cosmetologia, como é o caso dos poli-hidroxiácidos e dos alfa-cetoácidos, ainda são os AHA’s (alfa hidroxiácidos) e os BHA’s (beta hidroxiácidos) que lideram o ranking de aplicabilidade cosmetológica. Por isso, quero iniciar esta parte, esclarecendo uma dúvida muito comum: a diferença entre AHA’s e BHA’s.
Para entender bem este aspecto, preste atenção na seguinte explanação:
- Todo ácido orgânico possui a presença de um elemento chamado Carbono (C).
- Todo ácido orgânico possui esta representação química: COOH.
- O carbono alfa é o primeiro carbono a partir da representação química do ácido.
- O carbono beta é o segundo carbono a partir da representação química do ácido.
- Todo AHA ou BHA possui a presença de um elemento chamado hidroxila (OH).
- Quando a hidroxila está posicionada no carbono alfa, o ácido é um alfa hidroxiácido.
- Quando a hidroxila esta posicionada no carbono beta, o ácido é um beta hidroxiácido.
Considere o exemplo abaixo:
Isso quer dizer, de uma forma generalista, que os AHA’s costumam ser mais fortes em seu nível de atuação que os BHA’s, visto que estão mais próximos da cadeia principal do ácido (de sua representação química). Entretanto, o modo de atuação dos ácidos depende de algumas variáveis que obrigatoriamente devem ser levadas em consideração. São elas: a concentração, o pH, o pka, o peso molecular e a duração do contato.
Vejamos cada uma destas variáveis:
Concentração: É a porcentagem de ácido que é empregada na solução do produto acabado e determina a potência do produto.
Regra: Quanto maior a concentração, maior a potência e, por conseqüência, maior a atividade queratolítica (descamação), e também maior probabilidade de reações adversas.
Quanto menor a concentração, menor a potência, o que subentende-se por menor descamação e também menor probabilidade de reações adversas.
Mas é importante saber que, para aumentar ou diminuir a potência da concentração, é preciso observar a interferência do pH adotado na formulação.
Este é nosso próximo tópico e talvez o mais importante deles.
pH: Esta sigla quer dizer “potencial hidrogeniônico” (quantidade de H+ e OH- existente em determinado meio) e designa o nível de acidez, neutralidade ou alcalinidade do meio em questão.
O pH obedece uma escala já pré-determinada que varia de 0 a 14, conforme o esquematizado a seguir.
Obs: Lembrando que quando o pH está avaliado entre 5,5 e 6,9 o consideramos ligeiramente ácido.
Regra: Os valores de pH obedecem uma regra inversa ao da concentração: Quanto menor o pH, mais ácido será o produto e quanto maior o pH, menos ácido.
O pH é quem determina o nível de disponibilidade de um ácido na pele, ou seja, quanto da concentração deste ácido é realmente aproveitada pela pele.
Mas para isso, o pH depende de um segundo elemento que é o pKa (potencial de dissociação)
O pKa é um número fixo. Cada ácido tem seu próprio valor de pKa.
Ex: ácido glicólico = pKa 3,83
ácido mandélico = pKa 3,41
ácido láctico = pKa 3,86
O Pka deve ser levado em consideração porque o pH padrão de determinadas soluções ácidas é extremamente baixo para aplicações cutâneas, o que nos obriga a tamponar este ácido (adicionar uma fração sódica para aumentar seu pH). A capacidade máxima de tamponamento alcança seu pico no chamado valor de pKa.
O valor de pKa no caso dos ácidos representa um nível de pH em que 50% do ácido está na forma dissociada (neutralizada) e 50% na forma não dissociada (livre ou puro).
Mas a parte que realmente será aproveitada pela pele é somente a parte não dissociada, portanto, se o pH de um ácido for igual ou maior que seu valor de pKa, o aproveitamento de sua concentração na pele, será muito pequeno ou quase nada.
Para compreender melhor, veja este exemplo: uma solução de ácido glicólico a 70% possui pKa 3,83 e pH 0,6. No entanto, 0,6 é um pH demasiado ácido e teremos que tamponá-lo.
Se no tamponamento ajustarmos o pH deste ácido para 1,5, teremos uma disponibilidade de ácido na pele próxima a 70% (porque não está tão distante de 0,6). Mas se elevarmos o pH até ao seu nível de pKa= 3,83, destes 70%, teremos somente 35% de disponibilidade na pele e, se elevarmos outra vez o pH para 4,8, estes 70% representarão apenas 1% na pele. Pasmem!
Concluindo o pensamento, para aproveitamento real da concentração de um ácido na pele, temos que trabalhar com níveis de pH bem abaixo do valor de pKa.
Neste momento você deve estar se perguntado: “E a sensibilização da pele, onde fica?”. Pois quanto menor o pH de um ácido, maior será a sensibilidade e a propensão a reações irritativas.
É verdade, você tem razão! Por isso as aplicações de ácido seguem um protocolo mais cuidadoso, com outros produtos envolvidos, para termos o melhor resultado e a menor sensibilização possível.
Peso molecular: Também chamado de massa molecular, este termo refere-se ao tamanho da cadeia carbônica do ácido e determina a velocidade de penetração do mesmo na pele.
Regra: Quanto menor o peso molecular, mais rapidamente o ácido penetrará na pele e quanto maior, mais lentamente penetrará na pele.
Isso nos leva a concluir: ácidos que penetram lentamente na pele oferecem maior segurança para os procedimentos estéticos, pois antes que surjam quaisquer reações severas, aparecem indicadores, como queimação (que é diferente de ardência), leves erupções, início de edema ou rubor acentuado, que representam subsídeos importantes para que possamos tomar as devidas providências e controlar o problema.
Veja abaixo alguns ácidos bastante usuais com seus respectivos pesos moleculares em ordem para que você saiba conduzir sua análise.
Duração do Contato: Aqui estamos falando do tempo de permanência de um ácido na pele.
Cada ácido possui seu ótimo de atuação na pele e, para determinar este ótimo, é necessário a avaliação dos aspectos que abordamos anteriormente: concentração, pH e peso molecular do ácido em questão.
O local de aplicação também influencia na determinação deste tempo, pois regiões mais delicadas sugerem menor duração de contato.
É muito importante respeitar a indicação do tempo de contato do ácido com a pele, pois este fator possui relação direta com o efeito e também com o aparecimento de reações adversas. Quando a indicação é excedida, a possibilidade de complicações é muito maior.
A maioria dos ácidos possui tempo de aplicação padrão de dois a quinze minutos e sua neutralização é realizada geralmente com água ou com algum álcali específico.
Duração do Contato: Aqui estamos falando do tempo de permanência de um ácido na pele.
Cada ácido possui seu ótimo de atuação na pele e, para determinar este ótimo, é necessário a avaliação dos aspectos que abordamos anteriormente: concentração, pH e peso molecular do ácido em questão.
O local de aplicação também influencia na determinação deste tempo, pois regiões mais delicadas sugerem menor duração de contato.
É muito importante respeitar a indicação do tempo de contato do ácido com a pele, pois este fator possui relação direta com o efeito e também com o aparecimento de reações adversas. Quando a indicação é excedida, a possibilidade de complicações é muito maior.
A maioria dos ácidos possui tempo de aplicação padrão de dois a quinze minutos e sua neutralização é realizada geralmente com água ou com algum álcali específico.
Considerações Finais:
Estas características abordadas determinam a profundidade de atuação de um ácido, que poderá ser:
Superficial: ação da camada córnea até a derme papilar.
Médio: ação da derme papilar até a derme reticular superior.
Profundo: com ação na derme reticular média e profunda.
Isto significa que quanto maior a profundidade, mais complicações pós-ácido poderemos ter. E o pior é que nem sempre os resultados são mais significativos, o que implica que nem sempre compensa usar ácidos de ação profunda.
As complicações provenientes da aplicação de ácidos elaborados para a estética costumam ser temporárias e facilmente contornáveis. Já os ácidos de caráter médico, tendem a produzir agressões mais severas, mas nada que não possa ser normalizado pelo médico.
A melhor forma de evitar quaisquer tipos de complicação pós-acido é estarmos atentos às características do ácido, bem como às características da pele, que de modo algum poderá estar foto-danificada, excessivamente afinada ou em uso de medicação foto-sensibilizante.
Com conhecimento e bom senso dá para trabalhar somente com a parte em que os ácidos são os mocinhos da história... um grande abraço e boa sorte!
Fonte: Bel Col